Romantífica um jogo de palavras inspirado em "romantasia". Uma plavra-valise para ser mais exato e citar o criador do termo, Lewis Carroll, e dar um ar que eu tenho alguma ideia do que estou falando. Na romantasia, temos romance + fantasia, significando histórias fantásticas que trazem em si elementos de romance. Um bom exemplo é Cinderella, que inclusive é citada pelo pessoal da Noveletter em seu breve manifesto.
Os elementos fantásticos, especialmente de contos de fadas, parecem ter o romance como vocação. Já histórias futuristas ou alternativas parecem ter muito mais vocação para a crítica social, especulação tecnológica ou alertar contra futuros sombrios. Será? Histórias são feitas de gente, e onde estivermos, estarão as angústias e alegrias de nos relacionarmos. Assim, pensei em romantífica, romance + ficção científica, como uma proposta para unir alguns de meus contos em uma coletânea.
Há algumas semanas, fiz uma pesquisa informal no twitter e no instagram sobre a ficção científica e romance (lembrando que aqui romance é o elemento narrativo, e não o gênero romance como narrativa longa). Das respostas em múltipla escolha e comentários, pude confirmar algumas suspeitas.
Falando de ficção científica, perguntei porque as pessoas não leem este tipo de hisória. Dentre as opções, "falar mais de coisas que de gente" foi a mais votada, seguida por "ser viajado demais", "outros" e o leitor "não entender tanto de ciência". As pessoas deixaram comentários, algumas falando de dificuldades de se conectar à ambientação, excesso de núcleos, falta de desenvolvimento de personagem, trazer mais problemas que os que já temos na vida real. Ou seja, a fama que a ficção científica tem de se perder entre ambientação e eventos e acabar deixando personagens de lado. Ela faz jus a esta fama? Cada um que julgue com base em suas próprias experiências e leituras, mas minha opinião pessoal é que existem ficções científicas que quebram bem este estereótipo. Por outro lado, ficou nítida para mim a percpepção por parte desses leitores que os aspectos humanos/emocionais da trama são relegados a um plano secundário.
Já perguntando sobre romance, "ser enrolado/repetitivo" foi o motivo mais votado de rejeição ao elemento narrativo, seguido de "ser previsível", "outros" e "ser otimista demais". Nos comentários, surgiram afirmações sobre este elemento ser utilizado demais, especialmente de forma cis-heteronormativa. E também surgiram comentários de pessoas que se envolvem na narrativa a ponto de ficarem bravas/nervosas/angustiadas e preferirem evitar essa resposta emocional. Um comentário me chamou a atenção: que a história tem que ter algo além do relacionamento entre personagens para que seja cativante. Isso chega a ser quase o oposto de um comentário sobre ficção científica em que o que está fora dos personagens acaba se destacando mais que eles próprios.
Oposição? Eu prefiro interpretar como complementaridade. Relacionamentos existem sempre num contexto: não é difícil pensar numa releitura de Romeu e Julieta em praticamente qualquer cenário que possamos imaginar. De clãs rivais na era das cavernas a famílias de mercadores num entreposto comercial no cinturão de asteroides, passando por gangues inimigas numa Curitiba cyberpunk ou castas concorrentes numa distopia. Em cada um destes cenários o conflito entre os grupos será diferente, mas sempre afastará os amantes.
Da mesma forma, em praticamente qualquer cenário haverá pessoas que se relacionarão de forma dramática a ponto de gerar uma história. E estas formas de se relacionar serão influenciadas pelo contexto e pela tecnologia. De vinte anos para cá, tanta coisa mudou com o celular, internet, aplicativos de mensagens e de paquera que é difícil imaginar como serão os relacionamentos daqui a mais vinte anos. Até modelos de relacionamentos mudam, com aceitação cada vez maior por parte da sociedade da não-monogamia, relacionamentos poliamorosos e uniões homoafetivas por exemplo.
E até agora estou deixando de fora da equação tudo que for não-humano: espécies alienígenas, androides/ginoides, inteligências artificiais, híbridos e clones (se não forem considerados humanos, claro).
Pensar nessas histórias e propor isso não é novo, muito pelo contrário. Eu pessoalmente creio que a originalidade é apenas um mito e consigo citar sem pensar muito algumas obras que trazem esta interface romantífica: À sua imagem, Despertar, Ex Machina, Her, Babylon 5, Battlestar Galactica, e até aquele filme chatinho que o cara que não lembro o nome acorda a Jennifer Lawrence de seu sono criogênico. Poderia pegar cada uma dessas obras e tantas outras e fritar em cima de aspectos que envolvam a ficção científica e o romance, mas isso vai ter que ficar pra outra hora.
Hoje só queria apresentar o conceito, algumas reflexões e convidar vocês a explorarem os mundos de Romantífica: o livro traz nove contos em cenários variados e se encontra em financiamento coletivo para pré-venda até o dia 18/12/22, domingo, na Benfeitoria, e ficarei feliz se puderem contribuir, seja financeiramente, seja espalhando a palavra.
No mais, sem mais.
Abraços ictiomercuriais,
Thiago Ambrósio Lage (@thamblage)
PS.:
Na minha edição sobre vinil e fatiar o tempo eu comentei sobre o método pomodoro, e vendo o comentário de Ana Rüsche eu pensei: porque não fazer playlists com a duração de uns 25 minutos? O plano é fazer pelo menos uma por edição da Mercúrio em Peixes, e hoje tem: Romantífica Nacional (sim, estou pensando nas trilhas de novelas e logo sai a internacional). Espero que curtam!
Obrigado pela leitura!
Se gostou da newsletter, pode querer conferir o que tenho produzido como escritor em meu site, e como podcaster no Incêndio na Escrivaninha, junto das escritoras Ana Rüsche e Vanessa Guedes. E leiam as obras da Plutão Livros! Ou pode querer apenas me seguir nas redes twitter, instagram e facebook e ficar por dentro de minhas bobagens e novidades.
fantástica essa ideia, ansiosa p ler!
Nossa, essa edição me deu muitas ideias! E a referência a Babylon five me pegou!