Tudo começou a um tempo atrás quando
da botou na cabeça a ideia de fazer um evento sobre newsletters. E ideia boa em turma diposta é fagulha em campo seco. Logo rolou , e dele nasceu um grupo no telegram. Do grupo, muita troca e uma ideia: amigo oculto de cartas. Via newsletters, respondendo a alguma edição do amigo sorteado. E eis a minha carta:Minas, 26 de dezembro de 2022.
Minha querida Amiga Oculta,
Já começo meio errado, não colocando o nome da cidade no cabeçalho. Justo eu que adorei a ideia de colocar um cabeçalho tradicional num meio digital. Coisas da vida. Te escrevo de um lugar fictício, baseado no estado de Minas Gerais, um lugar feito de música e sentimento apenas. Aqui não há cidades senão as cidadezinhas arquetípicas do interior, ou a cidade grande sem nome. Mas todas são Minas, porque são muitas.
Quando aconteceu o sorteio, uma surpresa: não te conheço. Grupos grandes são um pouco assim como turmas de colégio, temos os que sentam perto, os que fazem trabalhos junto, os que passam um tempo no intervalo, os que se conhecem de vista, os de outras turmas… E calhou de sermos distantes. Que bom, nada contra meus amigos e chegados, mas com eles eu falo sempre e com você posso falar agora! Stalker que sou, fui conhecer melhor sua newsletter. Nem vou fazer mistério, é a
. A palavra travessia sempre me lembra da música de Milton Nascimento, e correndo o olho pelos títulos das edições vejo "resistindo na boca da noite um gosto de sol”, assim, entre aspas. Não pode ser coincidência. Li e reli sua edição, tem que ser essa, li algumas outras e estive contigo na praia, num consultório, em tantos cantos, mas… preciso falar de quando fomos a um show juntos. Não exatamente assim, mas sim.Dizem que um homem não atravessa o mesmo rio, mas por mais que o rio e o homem mudem, algo neles permanece o mesmo. Homens, mulheres, pessoas não-binárias e rios: somos todos como navios de Teseu. Pelo stalkerismo chuto que tenha assistido ao show em São Paulo, eu o assisti em Belo Horizonte. Queria muito ter escrito sobre ele e simplesmente não consegui e por isso acabei deixando de publicar por várias semanas. Entendi muito bem o seu intervalo do momento do show ao momento da escrita, é emoção demais para um coração humano metabolizar e mandar o cérebro transformar em palavras.
Caminhando por seu texto, pensei o tempo todo num episódio de Sense 8 (sinto que devia avisar que é um spoiler, mas isso se aplica a uma série de 2015 e numa cena que nem revela nada bombástico da trama?) em que uma personagem assiste a uma apresentação de música que é compartilhada telepaticamente com outros e todos eles usufruem juntos do espetáculo e memórias trazidas por ele. Mas nosso compartilhamento foi muito além do show, foi assíncrono no tempo e no espaço, e talvez por isso ainda mais verdadeiro. Passamos juntos(?) por tudo: marcar a data da compra de ingressos na agenda, a fila virtual e ansiedade da compra, a companhia da família (aqui fomos eu, mãe, pai e uma irmã, e dei os ingressos de meus pais como presentes de aniversário), a influência materna no gosto por Bituca, a ansiedade no grande dia, as fotografias antes da entrada e sobretudo a emoção. Durante duas horas e meia eu deixei de ser ateu. Esse seria o título de minha newsletter, e na sua se percebe toda a sacralidade da experiência que é a música de Milton no uso da linguagem: orixá da música, voz de deus. Senti o amor dEle quando a cada intervalo no mineirão lotado (onde estávamos juntos novamente graças ao milagre da TV ao vivo), Ele se voltava para o público e falava "Eu também amo vocês". Seria este o amor divino? Naqueles momentos me senti pleno. E pleno também me senti ao ouvir o Mineirão lotado cantando Calix Bento, uma música de reinado, no ápice da espiritualidade freestyle mineira, assunto pra outro dia.
Em sua newsletter você cita parte do repertório e me vi ali com tantas lembranças em músicas que também contam minha história, mesmo que sejam outras as favoritas e outras as memórias. Até a coincidência em Travessia na fossa pós-término, mas aqui foi ao contrário: eu recebi a letra da música num e-mail cheio de saudade por um amor que de encontro virou despedida.
Termino esta carta feliz de ter tanto em comum com você, Rafaela, a minha amiga oculta, minha companheira de show e a prova que um estranho pode ser só um amigo que ainda não conhecemos e com quem compartilhamos memórias sem saber.
Façamos como Bituca afirma em sua carta a Lennon e McCartney: sejamos do mundo.
Um grande abraço recheado de boa música e boas memórias,
Thiago
Esta foi a minha carta, e como estou entregando aos 47 do segundo tempo, já tive a alegria de ler a que recebi, escrita por
da disponível aqui (em inglês):Um bom fim de ano a todos, especialmente para meus amigos agora explícitos Angelo e Rafaela!
No mais, sem mais.
Abraços ictiomercuriais,
Thiago Ambrósio Lage (@thamblage)
PS.:
É com muita alegria que comunico que a minha coletânea Romantífica atingiu a meta estipulada na pré-venda e atualmente se encontra em processo de edição na Urutau. Obrigado a todos que ajudaram, seja financeiramente, seja espalhando a palavra.
Meu conto Seis Estrelas saiu na revista Escambanáutica. É uma fantasia urbana ambientada em Belo Horizonte e protagonizada por uma motorista-fantasma de aplicativo com algumas pendências com sua viúva. A trilha sonora do conto poderia muito bem ser Encontros e Despedidas. A revista é gratuita e pode ser obtida em diversos formatos eletrônicos no site da editora.
A edição que deu origem a esta resposta pode ser conferida na
Na minha edição sobre vinil e fatiar o tempo eu comentei sobre o método pomodoro, e vendo o comentário de
da eu pensei: porque não fazer playlists com a duração de uns 25 minutos? O plano é fazer pelo menos uma por edição da Mercúrio em Peixes, e hoje tem: Bituca Rafaela (com algumas citadas por Rafaela em sua newsletter). Espero que curtam!
Obrigado pela leitura!
Se gostou da newsletter, pode querer conferir o que tenho produzido como escritor em meu site, e como podcaster no Incêndio na Escrivaninha, junto das escritoras Ana Rüsche e Vanessa Guedes. E leiam as obras da Plutão Livros! Ou pode querer apenas me seguir nas redes twitter, instagram e facebook e ficar por dentro de minhas bobagens e novidades.
Eu leio seus textos com sua voz, amo! Vi esse show pelo Globoplay e chorei varias vezes. Com ctz, se deus existir , ou ele é milton ou gil.
que lindeza essa carta. e viva o Milton!