Um planeta em exílio. Um crime ambiental. Algo fora do lugar.
Por que newsletter?
Para desafiar Algoritmo.
Em tempos antigos, valia a conversa edificante, vulgo fofoca. Se não era testemunha ocular, restava ouvir falar. Cultura oral que fala né? E como quem conta um conto aumenta um ponto, todo emissor era um criador. E cada receptor pode se tornar um coautor numa nova iteração.
A escrita cristaliza a narrativa, mas o acesso estava (e ainda está, infelizmente) longe de ser universal. Tendo acesso a uma biblioteca, o leitor poderia escolher não apenas a obra, mas também o momento da leitura. Mas quem determinava os volumes presentes na coleção?
O áudio e depois o audiovisual perpetuam esta lógica da narrativa única e agora síncrona, com o rádio e a TV, ou assíncrona, no caso de fitas e discos de laser ou vinil. Chega a internet, ah o advento da internet! Com ela vem o nosso poder de escolha individual. Vejo, ouço e leio o que quero, e quando quero, desde que eu queira o que está disponível para mim. Quem determina o que está disponível? E com tanta facilidade para criar e publicar, como saber onde ir?
Numa ponta, o consumo-recepção síncrono, coletivo e curado (ou até improvisado) pelo produtor-emissor. Na outra, a assincronicidade, individualidade e acesso à diversidade. Mas num movimento pendular a internet foi ficando cada vez menos… livre? Diversa? Caótica? Sem propagandas?
As redes sociais trouxeram Algoritmo, e os buscadores a cultura do SEO (search engine optimization, otimização para motores de busca). Se a produção de conteúdo foi democratizada, a curadoria foi deixada a cargo de… quem? Algoritmo determina o que é ou não mostrado para cada um de nós. A criatura supera o criador e de curadoria automática de conteúdo, passa a ditar o conteúdo que é entregue. Sob sua batuta, todos fazem carrosséis, colocam filtros em cores quentes, fazem desafios sem sentido e dancinhas. Pavlov sorri. A marionete puxa as cordas e faz mexer a mão do titereiro.
Mas como unir o melhor de cada mundo? Uma ligação direta entre a pessoa que produz e a que consome conteúdo, uma forma assíncrona de consumir, a possibilidade de compartilhar e… eis a newsletter, anglicismo de difícil pronúncia mas ainda sem equivalente em português. Efimeridograma? Novaletra? Novidemail? Noticicarta?
Independente do nome, não as vejo como cartas em garrafas soltas ao mar, mas como um bilhete direcionado a cada um de vocês, mas escondido em algum ponto do espaço-tempo para encontrarem, abrirem e lerem quando for oportuno, e responderem se sentirem vontade.
Falo do mar e penso em líquido, no Mercúrio, prata líquida. Vivemos tempos líquidos, e falo isso com a cara-de-pau de nunca ter lido Bauman. Não é assim que funciona? Esses caras que, de tanto ouvirmos falar, logo estamos replicando com falsa propriedade em mesas de bar. Freud, Freire, Bauman. Penso em como a internet é líquida em suas metáforas. Por ela, navegamos, somos internautas, surfamos. Passamos por filtros em processos de separação levados pelo fluxo da informação. Criamos nossos filtros. Nos agrupamos (ou Algoritmo nos agrupa?) em bolhas, frágeis ovos flutuantes de casca líquida. Redes, que conectam, nos prendem. Postagens polêmicas são baits, iscas, ou mais inocentes, clickbaits em anzóis de pixels. Somos peixes nesse mar metálico, entretidos com nossos reflexos.
O nome da newsletter tem vários sentidos a serem explorados. Eu tenho uma biografia. Mas por hora, só quero os convidar para este mergulho e tentarmos explorar, juntos, o que escapa aos filtros e vive entre a trama da rede. Longe dos olhos de Algoritmo.
Abraços ictiomercuriais,
Thiago Ambrósio Lage (@thamblage)
EXTRAS
PS.: Uma amiga, a cineasta Alana Dysarsz, me indicou um curta semana passada que tange alguns pontos abordados aqui. Especialmente no terceiro ato e no epílogo. Se explicar demais, perde a graça. São 16 minutos que podem dar horas de boas reflexões e conversas. Fiquem com… Demônia.
PPS.: Para quem quiser me conhecer melhor, indico uma visita ao meu site. E se gostou de me ler e tem curiosidade sobre minha voz, sou um dos hosts do podcast Incêndio na Escrivaninha ao lado das escritoras Ana Rüsche e Vanessa Guedes.
PPPS.: Não sou tanto da poesia, mas escrevi isto divulgando a newsletter no instagram e gostei. Achei que compensaria vir para cá e dar um gosto do que está por vir.
Mercúrio em Peixes
Mercúrio.
Um metal. Um planeta. Um deus.
Um símbolo de força. Líquido.
Um corpo celeste. Místico.
Um deus mensageiro. Mentiroso.
Peixes.
Animais. Símbolos. Signo.
Vida. Palavra. Significado.
Movimento. Representação. Mensagem.
Mercúrio em Peixes.
Uma coordenada.
Um planeta em exílio.
Um crime ambiental.
Algo fora do lugar.
Obrigado pela leitura!
Se gostou da newsletter, pode querer conferir o que tenho produzido como escritor em meu site, e como podcaster no Incêndio na Escrivaninha, junto das escritoras Ana Rüsche e Vanessa Guedes. E leiam as obras da Plutão Livros! Ou pode querer apenas me seguir nas redes twitter, instagram e facebook e ficar por dentro de minhas bobagens e novidades.